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orla

quando eu era quase inacessível

eu tinha mais atalhos e remansos para o meu deleite

me vinham então

depois de longos caminhos dificultosos

visitas inesperadas e felizes


agora que em mim se instalou a via

a estrada que você construiu pra me servir

não vejo mais qualquer encanto em mim

fica tudo na conta do desenvolvimento insustentável do nosso tolo amor de verão

ai… e esse outono quente que ainda me traz você seminua


deve haver um jeito de proibir teu acesso aos meus líquidos

deve haver algum modo de impedir que você deite na minha cama

e se instale como uma felina


e agora eu não tenho o que fazer

só posso tentar preservar

as casuarinas

as conchas coloridas

as estrelas-do-mar

assim quem sabe consigo defender minha orla

pois você, eu sei

é devastação

você eu sei

vai trazer pra mim

o mal-estar

a saudade

a dor

e os cruzamentos engarrafados

vai infernizar minhas noites com faróis de neblina e buzinas estridentes

mas agora eu não tenho o que dizer


então vem

vem e me alicia

enquanto eu ainda em minha margem

posso desfrutar do sol

posso recolher o sal

posso reter calor

e te amar…

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