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volto

e vejo o mundo

assoberbado de preocupações e febres

nem vulcões são tão quentes

quanto essa vida labiríntica

que se pratica por aqui

 

eu tinha resolvido

esquecer essas temperaturas

esses aquecimentos globais

pensei em alienar

meu olhar e meu pulmão

viver sem perceber o outro

ali no frio da calçada

ali no vão do fim do mundo


sigo

e assisto quase hipnotizada

as novas páginas iluminadas

com histórias coloridas

em imagens que pulsam por segundo

o mundo

o país

a perversidade

a impunidade

os acordos

multidões

com fome

em guerras

catástrofes

a exatidão numérica

para o desenvolvimento humano

nas cidades que enlouquecem

e o planeta aquece...

 

ouço

tantos discursos fúteis

repetitivos e senis

de repente nada mais é atual

e são discursos vazio de conteúdo

mas fartos na periferia

onde tudo é permitido

do estupro à vilania


e ali nos feudos da Democracia

onde o Capital fundi deuses e servos

tantos não têm todo dia o que comer

uns cuidam de nossos jardins sem terem onde morar

outros ainda estão presos em grilhões

muitos desesperados na ilusão da prosperidade

e poucos são os Senhores de tantos domínios

onde mentem

aliciam

e nos torturam diariamente


ainda assim habitamos a mesma terra em perigo

vivemos no mesmo cenário de extinção

que a onça pintada no Cerrado

e o urso-polar no Canadá

 

eu pensava

que mais nenhuma dessas

casualidades capitalistas

me atingiriam no peito

com tanta força

e não é inquietação

é medo

é terror

é horror

o que invade minha pobre alma Pindorama

muito mais antiga e caduca

ainda repleta de Karajás e Bororos


olho de frente

nossas tragédias cotidianas

algumas já imperceptíveis a olho nu

a banalidade é óculos escuros

não temos mais tempo para colírios

então consumimos

intolerância

desesperança

preconceitos

ódios

desnutrição

devastação

e mortes

Gaza, Gabão, Morro do Alemão


no final

o que nos resta vem como um vírus

penetra, se instala, debilita e condena

e a sobrevivência é a entrega das nossa liberdade

nosso tempo funciona na lógica maniqueísta ocidental

entre o bem e o mau

numa moral que não convém a vida

na ordem que nos violenta todos os dias

que nos ausenta da dor

nos desvia das lágrimas nos olhos

dos que não têm nenhuma voz

e nos afasta do tempo presente

sem qualquer promessa de futuro


talvez a saída seja

o exílio

a solidão

pela impotência

pela incompreensão

por nosso enorme silêncio

e temor

diante do poder que prepara

a nossa própria destruição...

 


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